A sociedade civil precisa assumir o protagonismo das tecnologias digitais utilizadas nos processos educacionais, afirma pesquisadora
Quanto mais as tecnologias e plataformas educacionais ganham as salas de aulas, menos se reflete sobre quem controla e o que é feito a partir delas. A contradição é apontada […]

Quanto mais as tecnologias e plataformas educacionais ganham as salas de aulas, menos se reflete sobre quem controla e o que é feito a partir delas. A contradição é apontada pela pesquisadora Daiane Araújo, Assessora de Tecnologia da Informação da Ação Educativa e integrante da Tecla, iniciativa que discute organização político-social no campo das tecnologias digitais
Para Daiane, o esvaziamento na discussão no âmbito da sociedade civil a respeito dos caminhos da Tecnologias da Informação e Comunicação no país, permitiram que grandes conglomerados da tecnologia estabelecessem uma ofensiva que representa uma quase onipresença em qualquer espaço ou ação que associe educação e tecnologia no Brasil.
O alcance desse quase monopólio aparece, por exemplo, no relatório do projeto Educação Vigiada ( https://educacaovigiada.org.br/pt/sobre.html) que aponta que 74% das universidades públicas, 76% das Secretarias Estaduais de educação e 80% dos Institutos Federais já fizeram acordos com a Google ou Microsoft para utilização de suas tecnologias educacionais, só a Google tem sozinha 86% de todos os acordos.
“Hoje as plataformas educacionais utilizadas pelas redes de educação (principalmente públicas) no país pertencem a Google ou a Microsoft, onde os proprietários são estadunidenses e que não existe (por enquanto) uma regulação para elas no país. Nesse sentido é primordial a sociedade civil organizada, principalmente Secretarias de Educação, professores e alunos que vivem o dia a dia escolar estarem instrumentalizados para pensar quais plataformas e ferramentas educacionais fortalecem o processo educacional, inclusive para decidir se necessitam delas ou não”, defende Daiane.
Recursos Educacionais Abertos
O conceito de “recursos educacionais abertos” (REA) faz parte, explica Daiane, de um conjunto de esforços que visa fortalecer um contraponto à crescente mercantilização da educação por meio da tecnologia. Essa iniciativa busca fornecer estratégias e saberes que possibilitem com que as novas tecnologias viabilizem, de forma efetiva, a multiplicação de alternativas e possibilidades para a produção e o compartilhamento de conteúdos educativos por parte de professores e professoras, estudantes e comunidade.
De acordo com a Declaração de Paris 2012, os REA são materiais de ensino, aprendizagem e investigação em quaisquer suportes, digitais ou outros, que se situem no domínio público ou que tenham sido divulgados sob licença aberta que permite acesso, uso, adaptação e redistribuição gratuitos por terceiros, mediante nenhuma restrição ou poucas restrições.
Para Daiane, o que está em jogo é garantir com que o discurso de acesso à informação, liberdade de comunicação, debate plural de ideias e tantos outros adjetivos que exaltam a presença e o potencial da tecnologia na educação, não se transformem em palavras vazias, caso essas ferramentas estejam a serviço de grupos econômicos e interesses privados.
“Diversos atores disputam no âmbito político e acadêmico o caráter e a importância que as novas tecnologias podem ter no espaço escolar, assim como as práticas que devem ser priorizadas ou não. E, num contexto de crescente privatização da educação, o movimento os recursos educacionais abertos e sua filosofia de abertura e colaboração participam do debate defendendo o direito ao conhecimento, à cultura e à informação e a criação de um repositório de conteúdos educativos livres”, declara.
Letramento Digital
Outro ponto de atenção, levantado por Daiane, é a tomada de consciência que o uso da Internet e dos demais produtos de tecnologia exigem um processo de aprendizado, que não pode se limitar ao ter acesso ou “saber onde aperta” – o que seria, a título de comparação, um processo de “Alfabetização Digital”, é preciso investir no “Letramento Digital”.
“É importante confrontar sobre a uma distinção entre Alfabetização Digital e Letramento Digital, em diversos textos a Alfabetização vem do campo onde o indivíduo desenvolve a competência da leitura e a escrita, enquanto o letramento se ocupa da função social dessa leitura. No letramento o indivíduo passa olhar para o como componente histórico e social, onde aquele computador site e plataforma tem uma razão de existir”, pontua.
Um olhar mais qualificado, resultado do letramento digital, sobre o uso das tecnologias é essencial para o exercício da cidadania e dos direitos correlacionados à ela, observa Daiane. É dentro deste cenário, que a Ação Educativa, desenvolve o projeto Tecla (Tecnologia em Ação), iniciativa que engaja a organização e suas redes nas incidências políticas das tecnologias digitais através de quatro caminhos, que com as linhas de atuação de Formação, Informação e Pesquisa promove a participação da organização em redes, coalizões e campanhas em defesa de direitos digitais
No final de 2022, a Tecla lançou um repositório de práticas pedagógicas e tecnológicas no combate ao racismo e discriminação através de um edital onde foram selecionados planos de professores e professoras do Brasil todo. Além disso, o Centro de formação da Ação Educativa promoveu dois cursos com temas Desigualdades e Internet e também Racismo algorítmico.